O impacto silencioso da poluição sonora na saúde mental dos portugueses

O impacto silencioso da poluição sonora na saúde mental dos portugueses
Num país onde o barulho se tornou a banda sonora do quotidiano, poucos se apercebem do preço que a saúde mental está a pagar. O ruído constante das cidades, o zumbido interminável do trânsito e a poluição sonora dos espaços públicos estão a criar uma epidemia silenciosa de stress, ansiedade e distúrbios do sono entre os portugueses.

Investigadores do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto confirmam que a exposição crónica a níveis sonoros acima dos 55 decibéis – valor facilmente ultrapassado na maioria das zonas urbanas – aumenta em 25% o risco de desenvolver perturbações de ansiedade. Os dados são alarmantes: Lisboa e Porto registam médias de 65 a 70 decibéis durante o dia, valores que a Organização Mundial de Saúde classifica como prejudiciais.

O problema vai além do incómodo momentâneo. O neurologista Miguel Santos explica que "o cérebro humano nunca se desliga completamente do ruído ambiental, mesmo durante o sono. Esta vigilância constante impede a recuperação mental adequada e leva a um estado de hipervigilância crónica".

As consequências manifestam-se de formas subtis mas devastadoras: dificuldade de concentração, irritabilidade constante, diminuição da produtividade laboral e, nos casos mais graves, o desenvolvimento de acufenos – aqueles zumbidos nos ouvidos que não têm origem física mas sim neurológica.

A arquiteta paisagista Carolina Mendes defende uma revolução no planeamento urbano. "Precisamos de criar mais zonas de silêncio nas cidades, incorporar barreiras acústicas naturais na arquitetura e repensar a mobilidade urbana. Os 'oásis de silêncio' não são um luxo – são uma necessidade de saúde pública".

Algumas cidades europeias já implementaram medidas radicais. Paris criou "zonas de tranquilidade" onde o ruído não pode exceder os 45 decibéis, enquanto Berlim estabeleceu horários noturnos rigorosos para obras e atividades comerciais. Em Portugal, o debate ainda engatinha, mas especialistas alertam para a urgência do tema.

A solução pode começar em casa. Especialistas recomendam a criação de "santuários de silêncio" – espaços livres de dispositivos eletrónicos e ruído exterior, onde seja possível desligar verdadeiramente. Pequenas mudanças como instalar vidros duplos, usar cortinas pesadas ou incorporar fontes sonoras relaxantes podem fazer uma diferença significativa.

O mais preocupante, segundo os psicólogos, é a normalização do ruído excessivo. "As pessoas perderam a capacidade de valorizar o silêncio. Vivemos numa sociedade que tem medo do vazio acústico, que preenche todos os espaços com som", reflete a psicóloga clínica Isabel Teixeira.

A verdade é que o direito ao silêncio deveria ser tão fundamental como o direito à saúde. Enquanto as cidades continuarem a crescer sem planeamento acústico, continuaremos a pagar um preço elevado em bem-estar mental. O desafio está lançado: como podemos reconquistar o silêncio nas nossas vidas?

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