Há um silêncio ensurdecedor nas salas de reuniões das seguradoras portuguesas. Enquanto os consumidores se debatem com aumentos de prémios que parecem não ter fim, as companhias de seguros guardam nos cofres segredos que poderiam mudar completamente a forma como contratamos a proteção dos nossos veículos. A verdade é que 2024 trouxe alterações profundas no setor, mas poucos sabem realmente como tirar partido delas.
Vamos começar pelo elefante na sala: a portabilidade do seguro automóvel. Desde janeiro que os portugueses podem mudar de seguradora em qualquer altura do ano, sem penalizações. O que não lhe dizem é que as empresas criaram estratégias agressivas de retenção de clientes, oferecendo descontos ocultos apenas quando ameaçados com a fuga para a concorrência. É um jogo de póquer onde quem não blefa perde centenas de euros anuais.
A telemetria deixou de ser uma opção exótica para se tornar a arma secreta dos condutores económicos. Os dispositivos que monitorizam a condução prometem descontos até 30%, mas há um detalhe sutil: as seguradoras usam esses dados não apenas para recompensar a boa condução, mas para criar perfis de risco cada vez mais precisos. Uma travagem brusca numa curva de Sintra pode custar mais do que o susto momentâneo.
As coberturas para veículos elétricos são o novo campo de batalha. Com a explosão das vendas de carros elétricos em Portugal – crescimento de 67% no último ano – as seguradoras desenvolveram produtos específicos que poucos conhecem. Desde a proteção da bateria (que pode custar mais de 15.000 euros para substituir) até aos sistemas de assistência em viagem para pontos de carregamento, há um mundo de opções que os mediadores tradicionais muitas vezes ignoram.
O segredo mais bem guardado está nos seguros por uso. Imagine pagar apenas pelos quilómetros que realmente faz – parece utopia, mas já existe em Portugal através de startups que desafiam as gigantes tradicionais. O modelo é simples: uma base mensal mais um valor por quilómetro percorrido. Para quem trabalha remotamente ou usa maioritariamente transportes públicos, a poupança pode ultrapassar os 40% comparando com um seguro tradicional.
As franquias transformaram-se num campo minado. O que era suposto ser um mecanismo para baixar prémios tornou-se numa armadilha para desinformados. As seguradoras oferecem descontos atrativos para franquias elevadas, mas esquecem-se de mencionar que em muitos sinistros menores – os mais comuns – o cliente acaba por pagar do próprio bolso sem qualquer retorno da seguradora. É como comprar um guarda-chuva que só abre quando chove torrencialmente.
A digitalização trouxe consigo uma revolução silenciosa. Os processos que antes demoravam semanas agora resolvem-se em horas através de aplicações móveis. Mas esta conveniência tem um preço: a perda do contacto humano e a dificuldade em negociar condições específicas. As inteligências artificiais que processam as reclamações são programadas para encontrar padrões que justifiquem recusas – uma batalha desigual entre algoritmos e necessidades reais.
Os jovens condutores enfrentam o dilema mais cruel: prémios que muitas vezes superam o valor do próprio carro. O que raramente lhes é dito é que existem programas específicos de formação que, quando certificados, podem reduzir os valores em até 25%. São cursos que vão além da condução defensiva, incluindo módulos sobre manutenção básica e gestão de riscos – conhecimento que serve para a vida.
O mercado português de seguros automóvel está numa encruzilhada histórica. De um lado, a pressão regulatória para maior transparência; do outro, a necessidade das seguradoras de manter rentabilidade num setor hipercompetitivo. No meio ficam os consumidores, muitas vezes desarmados perante contratos com letra pequena que parecem escritos em código.
A solução? Informação. Comparar não apenas preços, mas condições. Questionar cada cláusula. Exigir explicações para termos técnicos. E sobretudo, perceber que o seguro mais barato é raramente o melhor – mas o mais caro também não é garantia de cobertura total. Neste jogo de sombras e luzes, a única arma verdadeiramente eficaz é o conhecimento. E esse, felizmente, ainda é gratuito.
Seguros automóvel em Portugal: o que as seguradoras não contam sobre as novas regras