O segredo sujo das seguradoras: como os algoritmos decidem quem paga mais pelo seguro auto

O segredo sujo das seguradoras: como os algoritmos decidem quem paga mais pelo seguro auto
Imagine que está a conduzir pela A5, cumpre todos os limites de velocidade, e de repente recebe uma notificação no telemóvel: o seu seguro automóvel aumentou 15%. Não cometeu nenhuma infração, não teve acidentes. O que aconteceu? Bem-vindo ao mundo obscuro dos algoritmos de seguros, onde os seus dados pessoais valem mais do que o seu histórico de condução.

Nas redações de jornais como o Observador e o Jornal Económico, começam a surgir histórias de condutores perplexos. Um relatório recente do ECO Sapo.pt revelou que as seguradoras portuguesas estão a comprar dados de localização de aplicações de telemóvel, hábitos de compra online e até informações de redes sociais. Tudo para alimentar máquinas que preveem riscos de forma cada vez mais intrusiva.

O problema, como aponta a Revista dos Seguros, é que estes sistemas são caixas negras. Ninguém sabe exactamente como funcionam. Um condutor de 25 anos que vive no centro de Lisboa pode pagar o dobro de um condutor de 40 anos no Algarve, mesmo com carros idênticos e históricos limpos. A discriminação algorítmica tornou-se a nova fronteira da desigualdade no sector automóvel.

Enquanto isso, sites especializados como o Razão Automóvel alertam para outro fenómeno: a subida galopante dos prémios. Em 2024, os seguros automóveis aumentaram em média 8,7% em Portugal, segundo dados do Automais.pt. A inflação justifica parte do aumento, mas especialistas apontam para estratégias agressivas de precificação baseada em perfis de risco cada vez mais detalhados.

Mas há luz no fim do túnel. A nova directiva europeia sobre serviços digitais começa a impor transparência. As seguradoras terão de explicar, de forma clara, como calculam os prémios de cada cliente. Não será suficiente dizer 'o algoritmo decidiu'. Terão de revelar que factores pesaram mais na decisão: a zona de residência, a idade, o modelo do carro ou dados comportamentais recolhidos à sua revelia.

O mais preocupante, investigámos, é que muitos portugueses nem sabem que estão a ser vigiados. Aceitam termos e condições sem ler, permitem o acesso à localização por conveniência, e depois surpreendem-se com aumentos inexplicáveis. A literacia digital em matéria de seguros está anos-luz atrás da tecnologia disponível.

E o que fazer enquanto consumidor? Primeiro, questione. Peça à sua seguradora que explique detalhadamente como chegou ao prémio que lhe está a cobrar. Segundo, compare. Use comparadores online, mas tenha em atenção que muitos são propriedade de grupos seguradores. Terceiro, proteja os seus dados. Reavalie as permissões que dá a aplicações no seu telemóvel, especialmente as relacionadas com localização.

O futuro dos seguros automóveis em Portugal está numa encruzilhada. Podemos seguir o caminho da vigilância total, onde cada quilómetro percorrido é analisado e monetizado. Ou podemos exigir um modelo mais justo e transparente, onde o prémio reflecte realmente o risco da condução, não o perfil digital do condutor.

Nas próximas semanas, esta investigação continuará. Vamos mergulhar mais fundo nos contratos das seguradoras com empresas de tecnologia, analisar casos concretos de aumentos suspeitos, e entrevistar os reguladores que deviam estar a proteger os consumidores. Porque quando se trata do seu seguro automóvel, o que não sabe pode custar-lhe centenas de euros por ano.

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