Num país onde a palavra 'seguro' evoca instantaneamente imagens de burocracia e letras miúdas, a realidade é que milhões de portugueses assinam contratos sem compreender verdadeiramente o que estão a adquirir. A investigação revela que 68% dos segurados nunca leram na íntegra as condições gerais das suas apólices, um dado alarmante quando falamos de proteção financeira para o que mais importa.
Os seguros automóveis, obrigatórios por lei, escondem nuances que podem fazer a diferença entre receber uma indemnização justa ou enfrentar meses de batalhas judiciais. A cláusula da franquia, por exemplo, é frequentemente mal interpretada. Muitos condutores acreditam que cobrirá qualquer dano, quando na realidade funciona como um limite mínimo de prejuízo abaixo do qual a seguradora não intervém.
No sector da saúde, assistimos a uma revolução silenciosa. Os seguros de saúde já não são um luxo para elites urbanas - cobrem hoje mais de 3 milhões de portugueses. Mas a escalada de preços tem sido superior à inflação durante cinco anos consecutivos, levantando questões sobre a sustentabilidade do modelo. As seguradoras argumentam com o aumento dos custos médicos, mas os consumidores sentem-se encurralados entre a necessidade de cobertura e orçamentos familiares cada vez mais apertados.
O seguro multirriscos habitacional tornou-se num must-have após os incêndios devastadores de 2017, mas poucos sabem que as apólices standard excluem frequentemente danos por catástrofes naturais sem coberturas adicionais. As inundações que afectaram o Vale do Tejo no inverno passado deixaram centenas de famílias sem compensação porque, tecnicamente, as suas zonas não foram classificadas como de risco elevado.
A digitalização trouxe consigo novas ameaças - e novas oportunidades. Os seguros cibernéticos são o segmento que mais cresce no mercado português, com aumento de 140% nas adesões no último ano. Pequenas e médias empresas começam a perceber que um ataque hacker pode significar a falência, mas a maioria ainda opera na ilusão de que 'isso só acontece aos outros'.
O grande tabu do sector continua a ser os seguros de vida. Culturalmente, os portugueses resistem a falar sobre mortalidade, resultando em subscrições tardias e coberturas insuficientes. Os especialistas alertam que esta relutância está a criar uma bomba-relógio social, onde famílias ficarão desprotegidas face ao imprevisto.
A supervisão da ASF (Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões) tem-se tornado mais rigorosa, com multas recorde aplicadas a seguradoras por práticas comerciais enganosas. Ainda assim, o cidadão comum sente-se perdido num emaranhado de termos técnicos e exclusões contratuais.
A verdade é que o seguro ideal não existe - existe o seguro adequado às necessidades específicas de cada pessoa ou família. A chave está na educação financeira e na coragem de fazer perguntas incómodas antes de assinar a próxima apólice. Num mundo cada vez mais imprevisível, a verdadeira proteção começa no conhecimento.
Seguros em Portugal: o que os portugueses não sabem sobre as suas apólices
