Os seguros em Portugal atravessam uma transformação silenciosa que poucos notam, mas que afecta milhões de portugueses. Das apólices de saúde aos automóveis, passando pelos seguros de vida, o sector está a reinventar-se num mundo pós-pandemia que trouxe novos riscos e novas expectativas.
A digitalização acelerou de forma irreversível. O que antes era um processo burocrático e moroso transformou-se numa experiência quase instantânea. As seguradoras perceberam que não podem competir apenas no preço – têm de oferecer simplicidade e transparência. Ainda assim, muitos consumidores continuam a sentir-se perdidos num labirinto de cláusulas e letras pequenas.
A saúde tornou-se o epicentro das preocupações. Após dois anos de pandemia, os portugueses redescobriram a importância de ter uma rede de segurança médica robusta. As seguradoras respondem com planos mais flexíveis, telemedicina e coberturas para tratamentos que antes eram considerados alternativos. Mas o desafio mantém-se: como tornar os seguros de saúde acessíveis a todos, não apenas a quem pode pagar premiums elevados?
No sector automóvel, a revolução é tecnológica. Os black boxes já não são novidade, mas a inteligência artificial está a transformar a forma como avaliamos o risco. Os condutores mais seguros podem finalmente ser recompensados de forma justa, enquanto os dados recolhidos ajudam a prevenir acidentes antes que aconteçam.
Os seguros de vida enfrentam o seu próprio paradoxo. Nunca foram tão necessários, mas também nunca foram tão difíceis de vender. As gerações mais jovens questionam a necessidade de produtos que associam a um passado distante. As seguradoras tentam adaptar-se com soluções mais flexíveis e digitais, mas a comunicação continua a ser o maior obstáculo.
A sustentabilidade entrou no vocabulário das seguradoras de forma definitiva. Desde seguros que promovem a eficiência energética até produtos que incentivam comportamentos ambientalmente responsáveis, o sector está a alinhar-se com as preocupações climáticas. Mas será suficiente? Os críticos argumentam que ainda há muito greenwashing e pouca acção concreta.
A regulação tornou-se mais exigente. A Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) tem vindo a apertar o cerco às práticas menos transparentes. As multas aumentaram, as inspecções tornaram-se mais frequentes e os consumidores ganharam mais instrumentos para reclamar. É uma mudança bem-vinda, mas que precisa de tempo para produzir todos os seus efeitos.
O grande desafio continua a ser a literacia financeira. Muitos portugueses ainda compram seguros sem compreender exactamente o que estão a adquirir. As apólices acumulam poeira em gavetas, os prémios são pagos automaticamente e, quando surge um sinistro, a surpresa é muitas vezes desagradável. Educar os consumidores não é apenas uma responsabilidade social – é um imperativo de negócio.
As insurtechs chegaram para ficar. As startups do sector segurador prometem descomplicar o que sempre foi complicado. Com interfaces intuitivos, processos simplificados e preços transparentes, estas novas empresas estão a forçar as tradicionais a saírem da sua zona de conforto. A concorrência é saudável, mas a estabilidade financeira continua a ser uma vantagem das seguradoras estabelecidas.
Os seguros colectivos ganharam nova relevância no mundo do trabalho remoto. As empresas procuram formas de proteger os colaboradores independentemente de onde trabalham, enquanto os trabalhadores valorizam cada vez mais benefícios que vão além do salário. É uma oportunidade para as seguradoras criarem produtos mais adaptados às novas realidades laborais.
O futuro passa pela personalização. Os seguros de amanhã serão tão únicos como as pessoas que os subscrevem. A tecnologia permitirá ajustar coberturas e preços em tempo real, baseando-se no comportamento actual e não em estatísticas do passado. Mas esta personalização traz consigo questões éticas importantes sobre privacidade e discriminação.
Os seguros de crédito e garantia enfrentam tempos conturbados. Com a inflação a subir e o custo de vida a aumentar, muitas famílias vêem-se obrigadas a cortar em despesas consideradas não essenciais. As seguradoras terão de demonstrar o valor real destes produtos num contexto económico mais desafiador.
A prevenção tornou-se tão importante como a compensação. As seguradoras estão a investir cada vez mais em serviços que evitam sinistros, desde consultoria de segurança até monitorização remota. É uma mudança de paradigma: em vez de apenas pagar quando algo corre mal, ajudam a garantir que nada corre mal.
Os seguros para pequenas empresas são uma fronteira por explorar. Muitos empreendedores subestimam os riscos que enfrentam ou consideram os seguros demasiado caros. Há espaço para produtos mais acessíveis e adaptados às necessidades específicas de cada sector.
A confiança continua a ser o activo mais valioso. Num sector onde a relação com o cliente é muitas vezes de longa duração, a transparência e a integridade são fundamentais. As seguradoras que compreenderem isto sobreviverão às mudanças tecnológicas e regulatorias. As outras ficarão pelo caminho.
O caminho à frente é desafiante mas promissor. Os seguros em Portugal têm a oportunidade de se tornarem mais justos, mais transparentes e mais úteis. Cabe aos consumidores exigirem estas mudanças e às seguradoras implementá-las. O resultado será um sector mais forte e mais capaz de cumprir a sua missão fundamental: proteger o que é importante.
Seguros em Portugal: o que mudou e o que precisa de mudar
