A tranquilidade de saber que estamos protegidos contra imprevistos tem um preço, mas será que os portugueses estão a pagar o justo valor pelos seus seguros? Nos últimos meses, as seguradoras nacionais têm registado lucros recorde, enquanto os consumidores se queixam de prémios cada vez mais elevados. A entrada em vigor de novas diretivas europeias promete trazer mais transparência ao setor, mas será suficiente?
A Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) revelou recentemente que o volume de prémios atingiu os 14 mil milhões de euros em 2023, um aumento de 6,2% face ao ano anterior. No entanto, as queixas dos consumidores subiram 18%, com destaque para os seguros automóvel e saúde. "Há uma assimetria de informação gritante entre seguradoras e clientes", afirma Maria Silva, presidente da Associação Portuguesa de Direito do Seguro.
As novas regras da Diretiva Solvência II, que entram em vigor em janeiro de 2024, obrigam as seguradoras a comunicarem de forma mais clara as exclusões dos contratos e os critérios de cálculo dos prémios. "Finalmente vamos saber porque é que o nosso vizinho paga menos pelo mesmo seguro de automóvel", comenta Pedro Almeida, especialista em direito do consumo.
O setor dos seguros de saúde vive particular momento de viragem. Com listas de espera no SNS a atingirem valores históricos, cada vez mais portugueses optam por seguros privados. Mas os preços dispararam: um seguro de saúde familiar custa em média mais 120 euros por ano do que em 2022. "É um mercado oligopolizado onde três seguradoras detêm 70% da quota", denuncia Carlos Mendes, da DECO.
Nos seguros habitacionais, a subida dos juros e a inflação trouxeram novos desafios. Muitas famílias descobriram que as suas apólices não cobrem adequadamente a valorização dos imóveis devido à inflação. "As pessoas pensam que estão totalmente protegidas, mas quando precisam de acionar o seguro descobrem que a cobertura é insuficiente", alerta Sofia Pereira, mediadora de seguros com 20 anos de experiência.
A digitalização trouxe oportunidades e riscos. Apps que prometem seguros em cinco minutos escondem por vezes condições abusivas nas letras pequenas. "A facilidade de contratualização online não pode significar menos direitos para os consumidores", defende Ana Lopes, da ASF.
Para os especialistas, a chave está na literacia financeira. "Os portugueses precisam de entender que o seguro mais barato não é necessariamente o melhor, e que devem comparar coberturas e não apenas preços", recomenda Miguel Santos, professor de finanças na Universidade Nova.
O futuro trará seguros cada vez mais personalizados, com base em dados de telemetria nos automóveis ou wearables na saúde. "Será possível pagar apenas pelo risco real que representamos, mas isso levanta questões éticas importantes sobre privacidade de dados", antevê Inês Moura, especialista em insurtech.
Enquanto isso, as seguradoras tradicionais preparam-se para mais um ano de lucros robustos. Os analistas preveem crescimento de 4 a 5% em 2024, impulsionado pela subida dos prémios e pela menor sinistralidade em alguns ramos.
Para o consumidor, a mensagem é clara: informar-se, comparar e negociar. "Nunca foi tão importante ler as letras pequenas e questionar o que não se percebe", conclui Maria Silva. Afinal, a verdadeira proteção começa na informação.
Seguros em Portugal: o que muda com as novas regras europeias e como proteger o seu património
