Num país onde o Serviço Nacional de Saúde enfrenta tempos conturbados, os seguros de saúde tornaram-se não apenas um luxo, mas uma necessidade para muitas famílias portuguesas. Mas será que sabemos realmente o que estamos a comprar quando assinamos uma apólice? A verdade é que as letras pequenas escondem segredos que podem custar caro aos consumidores.
As exclusões são o calcanhar de Aquiles dos seguros de saúde. Muitos portugueses só descobrem na hora H que a sua apólice não cobre determinados tratamentos ou especialidades. Doenças pré-existentes, tratamentos experimentais ou mesmo algumas especialidades como psiquiatria ou fisioterapia são frequentemente excluídas ou sujeitas a períodos de carência absurdamente longos.
Os limites de indemnização são outra armadilha bem escondida. As seguradoras definem tetos anuais para diferentes tipos de tratamento, mas raramente explicam claramente estas limitações aos clientes. Um tratamento oncológico pode rapidamente esgotar o plafond anual, deixando o segurado numa situação precária exatamente quando mais precisa de proteção.
As redes de prestadores são um mundo à parte. Muitas apólices prometem acesso a centenas de hospitais e clínicas, mas a realidade é que os melhores especialistas muitas vezes não integram essas redes. O segurado acaba por ter de escolher entre pagar do próprio bolso ou contentar-se com profissionais que não seriam a sua primeira escolha.
Os preços das apólices têm subido consistentemente acima da inflação, mas a qualidade dos serviços não acompanha esta escalada. As seguradoras argumentam com o aumento dos custos médicos, mas os lucros recorde do sector contam uma história diferente. Em 2023, o sector segurador português registou lucros superiores a 800 milhões de euros, um aumento de 15% face ao ano anterior.
A digitalização trouxe comodidade, mas também novos riscos. As apólices online são mais baratas, mas muitas vezes oferecem coberturas mais limitadas e processos de reclamação mais complexos. Os chatbots e linhas de apoio automatizado dificultam o contacto humano quando surgem problemas graves.
A regulação do sector é insuficiente para proteger adequadamente os consumidores. A ASF (Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões) tem poderes limitados para intervir em disputas entre seguradoras e clientes, deixando muitos portugueses à mercê de arbitragens demoradas e custosas.
As apólices coletivas, frequentemente oferecidas através dos empregadores, são outra área nebulosa. Muitos trabalhadores não sabem que perdem a cobertura se mudarem de emprego, podendo ficar sem seguro precisamente quando desenvolvem problemas de saúde que os tornam não seguráveis para outras seguradoras.
A transparência na fixação de preços é praticamente inexistente. Dois clientes com perfis idênticos podem pagar valores radicalmente diferentes pela mesma cobertura, dependendo do canal de venda ou da negociação que conseguirem fazer. Esta falta de padrão prejudica sobretudo os menos informados.
As cláusulas de renovação automática são outra armadilha comum. Muitos portugueses continuam a pagar apólices que não adequam às suas necessidades atuais porque a renovação acontece automaticamente, sem uma revisão adequada das condições e preços.
O futuro dos seguros de saúde em Portugal depende de uma maior literacia financeira e médica por parte dos consumidores, mas também de uma regulação mais rigorosa que obrigue as seguradoras a uma transparência total. Até lá, caberá aos portugueses desvendar os mistérios das letras pequenas antes de assinar qualquer apólice.
Seguros em Portugal: o que as seguradoras não contam sobre as apólices de saúde
