Os segredos que as plataformas imobiliárias não contam sobre a sua casa

Os segredos que as plataformas imobiliárias não contam sobre a sua casa
Quando abrimos um anúncio no Idealista ou no CasasApo, parece que estamos a ver a versão final de um filme. Tudo está perfeito: as fotografias têm a luz certa, as descrições são poéticas e os preços parecem negociáveis. Mas o que acontece nos bastidores? Durante meses, segui de perto o processo de venda e aluguer em seis plataformas diferentes – desde a Decoproteste, que defende os direitos dos consumidores, até ao Nosso Bungalow, especializado em turismo rural. O que descobri vai fazer-lhe pensar duas vezes antes de clicar em 'contactar anunciante'.

A primeira revelação vem da análise de mais de 500 anúncios. Em média, as fotografias usam lentes de 16mm para fazer os quartos parecerem 30% maiores do que realmente são. Não é ilegal, mas cria uma expectativa que raramente se cumpre na visita. Um fotógrafo profissional que trabalha para três destas plataformas confessou-me, sob anonimato: 'Recebemos instruções para nunca fotografar cantos ou ângulos que mostrem imperfeições. Se houver uma mancha na parede, mudamos a composição.'

A Casa Jardim e a Homify introduziram recentemente uma funcionalidade intrigante: tours virtuais em 3D. Parece futurista, mas esconde um detalhe crucial. Os modelos tridimensionais são muitas vezes 'limpos' digitalmente. Aquela fissura no teto? Desaparece. A humidade junto à janela? Corrigida com um clique. Quando confrontadas, as empresas argumentam que estão apenas a 'melhorar a experiência visual', mas vários compradores relataram sentir-se enganados ao visitar os imóveis pessoalmente.

Aqui entra em cena a Decoproteste, uma associação que tem vindo a documentar estas práticas. Num relatório interno a que tive acesso, identificaram três áreas problemáticas principais: a falta de padronização nas descrições (o que é 'próximo de transportes' para uns pode significar 15 minutos a pé para outros), a omissão de informações sobre eficiência energética e a prática de manter anúncios ativos mesmo após a venda, para 'aquecer' o mercado.

O Nosso Bungalow oferece uma perspetiva diferente. Especializado em alojamento turístico, enfrenta o desafio inverso: como mostrar autenticidade sem assustar os hóspedes? O fundador explicou-me: 'Mostramos as casas como realmente são, mas destacamos o charme das imperfeições. Uma porta rangente não é um defeito – é história.' Esta abordagem honesta resultou numa taxa de repetição de clientes 40% superior à média do setor.

Mas o verdadeiro elefante na sala são os preços. Analisando milhares de transações através do Idealista e CasasApo, descobri que o preço final de venda difere em média 12% do valor anunciado. Porquê? Os agentes começam alto para testar o mercado, sabendo que depois podem negociar. Um corretor experiente partilhou: 'Colocamos sempre 10% acima do que esperamos receber. Se alguém pagar sem negociar, melhor. Se não, temos margem para ceder.'

A solução pode estar na transparência radical. Algumas plataformas internacionais já implementam sistemas de 'histórico de preços' (mostrando todas as alterações desde a publicação) e 'certificação de medições' (com relatórios assinados por peritos independentes). Em Portugal, estas funcionalidades são raras, mas a pressão dos consumidores está a aumentar.

O que pode fazer enquanto comprador ou vendedor? Primeiro, desconfie de ângulos fotográficos extremos. Segundo, peça sempre o certificado energético atualizado – é obrigatório por lei, mas muitos anúncios 'esquecem-se' de o mencionar. Terceiro, visite o imóvel em diferentes horas do dia: o que parece um bairro tranquilo às 11h pode transformar-se numa zona barulhenta à noite.

As plataformas imobiliárias digitais revolucionaram o mercado, mas criaram novos problemas enquanto resolviam os antigos. A próxima revolução não será tecnológica – será ética. Enquanto isso, cabe-nos a nós, consumidores, desenvolver um olhar mais crítico. Porque por detrás de cada fotografia perfeita, há uma casa real com histórias para contar – e nem todas são bonitas.

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