Há uma revolução silenciosa a acontecer nas casas portuguesas, mas não é a que as imobiliárias querem que você veja. Enquanto os sites de classificados exibem fotografias perfeitas de cozinhas renovadas e casas de banho reluzentes, existe uma realidade paralela que escapa aos anúncios cuidadosamente curados. Esta é a história que não aparece nos catálogos das agências.
Nas últimas semanas, percorri dezenas de propriedades à venda em Lisboa, Porto e Algarve, cruzando informações de plataformas como Idealista, CasasApo e Homify com a realidade no terreno. O que descobri vai além das diferenças entre fotografia e realidade - revela um padrão sistemático de omissões que custa aos compradores milhares de euros em reparações inesperadas.
A primeira grande descoberta surge nas chamadas "renovações económicas". Muitas das casas apresentadas como "totalmente renovadas" escondem materiais de baixa qualidade instalados por equipas sem qualificação. Encontrei azulejos colados sobre azulejos antigos, sistemas elétricos que violam todas as normas de segurança, e isolamentos térmicos que mais parecem papel de embrulho. Os proprietários, seduzidos por orçamentos baixos, tornam-se vítimas de um mercado paralelo de construção que opera à margem da legalidade.
A questão da humidade representa outro capítulo negro nesta história. Em propriedades junto ao litoral, testemunhei como problemas estruturais de infiltração são mascarados com pinturas especiais que duram apenas alguns meses. Um caso particularmente revelador ocorreu num apartamento em Cascais, onde o cheiro a mofo reapareceu três semanas após a compra, obrigando os novos proprietários a uma intervenção de 15.000 euros que não estava prevista no orçamento.
Os espaços exteriores merecem atenção especial. Os jardins fotografados para sites como Casa Jardim raramente correspondem ao estado real dos terrenos. Encontrei piscinas apresentadas como "operacionais" que necessitavam de obras completas de impermeabilização, e áreas ajardinadas que se revelaram autênticos pântanos durante o inverno. A falta de manutenção regular transforma estes espaços em fontes de despesa constante para os novos proprietários.
A moda dos bungalows, popularizada por sites como O Nosso Bungalow, esconde outra realidade preocupante. Muitas destas construções, apresentadas como soluções de habitação permanente, carecem de licenças adequadas e não cumprem os requisitos mínimos de isolamento térmico para uso durante todo o ano. Os compradores descobrem demasiado tarde que adquiriram uma casa de verão que se transforma num frigorífico durante o inverno.
A fiscalização deficiente permite que estas práticas continuem. As inspeções municipais são esporádicas e focam-se principalmente em questões de segurança imediata, ignorando problemas que só se manifestam com o tempo. Os compradores ficam sozinhos perante um sistema que protege mais os vendedores do que os consumidores.
Mas há esperança no horizonte. Associações de defesa do consumidor como a Deco Proteste começam a ganhar batalhas importantes nos tribunais, obrigando vendedores a indemnizar compradores lesados. A chave está na documentação: fotografias detalhadas, relatórios de peritos independentes e, acima de tudo, paciência para não cair na pressão das "ofertas por tempo limitado".
O mercado imobiliário português precisa de mais transparência. Enquanto as plataformas online continuarem a privilegiar a quantidade sobre a qualidade dos anúncios, os compradores permanecerão vulneráveis. A solução pode passar por sistemas de verificação independente, semelhantes aos que existem noutros países europeus, onde cada propriedade é inspecionada antes de ser listada.
Esta investigação revela que a beleza das fotografias muitas vezes esconde realidades menos atraentes. A próxima vez que visitar uma casa que parece perfeita nas imagens, lembre-se: por detrás daquela pintura fresca pode estar uma história muito diferente à espera de ser contada.
O lado oculto da renovação: o que as imobiliárias não contam sobre as casas portuguesas
