Quando Maria contratou um pintor através de um anúncio online, nunca imaginou que a simples tarefa de renovar a sala se transformaria num pesadelo de três meses. A tinta começou a descascar após a primeira chuva, o orçamento inicial triplicou e o suposto profissional desapareceu sem deixar rasto. Esta história, infelizmente comum em Portugal, revela as armadilhas escondidas no aparentemente simples mundo dos serviços domésticos.
A verdade é que a contratação de serviços para casa tornou-se num campo minado para os consumidores portugueses. Segundo dados da DECO Proteste, as queixas relacionadas com serviços de reparação e manutenção doméstica aumentaram 23% no último ano. Os problemas vão desde orçamentos inflacionados até trabalhos mal executados que exigem correções dispendiosas.
O mercado português de serviços domésticos opera num equilíbrio precário entre a economia informal e o profissionalismo. Muitos dos chamados 'faz-tudo' que proliferam em plataformas como CasasApo ou Idealista carecem de qualificações adequadas, seguros de responsabilidade civil ou mesmo alvarás municipais. Esta informalidade tem um preço: o consumitor fica desprotegido quando algo corre mal.
A investigação revela que os portugueses gastam em média 1.200 euros anuais em serviços domésticos, desde canalizações simples até remodelações completas. No entanto, cerca de 40% destes gastos são em correções de trabalhos mal executados. Este ciclo vicioso não só prejudica as finanças familiares como perpetua um mercado pouco transparente.
As plataformas online trouxeram conveniência mas também novos riscos. Sites como Homify e O Nosso Bungalow oferecem milhares de profissionais, mas a verificação das suas credenciais muitas vezes fica aquém do necessário. O sistema de avaliações, em teoria uma ferramenta de proteção ao consumidor, pode ser facilmente manipulado através de comentários falsos.
A falta de regulamentação específica para muitos destes serviços cria um vazio legal perigoso. Enquanto atividades como a eletricidade exigem certificação, outras como pintura ou pequenas reparações operam num limbo jurídico. Esta situação deixa os consumidores vulneráveis e os profissionais sérios em desvantagem face à concorrência desleal.
Os casos mais problemáticos envolvem frequentemente serviços complexos como remodelações de cozinhas ou casas de banho. Nestas situações, os prejuízos podem ascender a dezenas de milhares de euros. A DECO alerta para a importância de contratos detalhados que especifiquem prazos, materiais a utilizar e formas de resolução de conflitos.
A solução passa por uma mudança cultural tanto nos consumidores como nos prestadores de serviço. Os portugueses precisam de abandonar a mentalidade do 'mais barato' e valorizar a qualidade e a segurança. Por outro lado, os profissionais devem entender que a transparência e o profissionalismo são investimentos que se pagam a longo prazo.
Algumas boas práticas podem fazer a diferença: solicitar sempre orçamentos detalhados por escrito, verificar referências anteriores, confirmar a existência de seguros e evitar pagamentos antecipados significativos. Estas precauções simples podem prevenir a maioria dos problemas mais comuns.
O futuro do setor poderá passar pela certificação obrigatória e pela criação de plataformas mais robustas de verificação de profissionais. Alguns países europeus já implementaram sistemas onde apenas técnicos certificados podem anunciar os seus serviços, com mecanismos eficazes de resolução de litígios.
Enquanto estas mudanças não chegam, cabe aos consumidores portugueses informarem-se e protegerem-se. A contratação de serviços domésticos não deve ser uma roleta russa, mas sim uma transação baseada na confiança e no profissionalismo. A casa é o nosso refúgio, e merece que os cuidados com a sua manutenção sejam tão sérios como a importância que ela tem nas nossas vidas.
O lado oculto da contratação de serviços domésticos: o que os portugueses precisam de saber
