Quando abrimos uma aplicação para contratar um canalizador, um eletricista ou um jardineiro, raramente pensamos no que se esconde por detrás daqueles perfis bem apresentados. As plataformas digitais criaram a ilusão de que contratar serviços para casa é tão simples como encomendar uma pizza. Mas a realidade é bem mais complexa e, por vezes, perigosa.
A investigação que conduzi junto de várias plataformas portuguesas revela um mundo de lacunas regulatórias e informações omitidas que podem colocar os consumidores em risco. Enquanto as empresas apresentam-se como meras intermediárias, a verdade é que a sua responsabilidade vai muito além do que admitem publicamente.
Um dos aspectos mais preocupantes diz respeito à verificação das qualificações profissionais. Na maior parte dos casos, as plataformas limitam-se a confirmar dados básicos como o número de contribuinte, sem validar competências técnicas ou formação específica. Isto significa que alguém sem qualificações adequadas pode facilmente apresentar-se como especialista em áreas que exigem conhecimentos técnicos avançados.
A questão da responsabilidade civil é outra área nebulosa. Quando algo corre mal durante uma intervenção em casa, quem responde? As plataformas protegem-se com cláusulas contratuais que as colocam fora da equação, deixando o consumidor num limbo jurídico entre o prestador de serviços e a empresa intermediária.
Os sistemas de avaliação, aparentemente transparentes, escondem mecanismos de manipulação subtis. Muitas plataformas removem críticas negativas sob o argumento de violação de termos de serviço, criando uma imagem artificialmente positiva dos prestadores. Além disso, a pressão para manter classificações elevadas leva muitos profissionais a oferecer descontos em troca de boas avaliações, distorcendo o sistema.
A falta de transparência nos preços é outra prática comum. Os orçamentos iniciais raramente reflectem o custo final, com acréscimos justificados por "imprevistos" que, na verdade, poderiam ter sido antecipados por um profissional competente. Esta estratégia de preços baixos na atração do cliente, seguida de aumentos significativos durante a execução, tornou-se padrão no sector.
A segurança dos dados pessoais é outra preocupação crescente. Ao partilharmos informações sobre a nossa casa e hábitos com múltiplos prestadores através destas plataformas, estamos a criar um perfil detalhado que pode ser utilizado para fins comerciais ou, no pior cenário, cair em mãos erradas.
As soluções passam por uma maior regulação do sector e por uma atitude mais crítica por parte dos consumidores. Exigir certificações, pedir referências anteriores e ler as letras pequenas dos contratos são passos essenciais para proteger os nossos interesses.
O futuro dos serviços domésticos digitais depende da capacidade de criar sistemas mais transparentes e responsáveis. Enquanto isso não acontecer, cabe aos consumidores desconfiar das soluções aparentemente perfeitas e investir tempo na seleção cuidadosa de quem entra nas nossas casas.
O lado oculto da contratação de serviços domésticos: o que as plataformas não te contam
