O som do silêncio: como a perda auditiva invisível afeta a vida dos portugueses

O som do silêncio: como a perda auditiva invisível afeta a vida dos portugueses
Num café de Lisboa, um homem de meia-idade inclina-se para a frente, o ouvido direito voltado para o interlocutor. Os dedos tamborilam nervosamente na chávena de café já frio. Não ouve o barulho da rua, nem o tilintar das colheres, nem o murmúrio das conversas à sua volta. O seu mundo sonoro reduziu-se a um estreito corredor de sons, como se vivesse permanentemente dentro de um aquário.

Esta cena repete-se diariamente em milhares de locais por todo o país. A perda auditiva, muitas vezes silenciosa e progressiva, tornou-se uma epidemia invisível que afeta cerca de 20% da população portuguesa, segundo dados da Organização Mundial de Saúde. Mas quantos realmente admitem o problema?

A verdade é que a sociedade portuguesa ainda vive num paradoxo sonoro. Por um lado, valorizamos o convívio, as conversas à mesa, o fado e a música tradicional. Por outro, ignoramos os sinais de alerta que o nosso corpo nos envia. A exposição prolongada a ruídos intensos, o envelhecimento natural e até certos medicamentos contribuem para este declínio auditivo que muitos teimam em negar.

O impacto vai muito além de simplesmente não ouvir bem. Estudos recentes demonstram uma ligação direta entre a perda auditiva não tratada e o isolamento social, depressão e mesmo declínio cognitivo. As pessoas começam a evitar situações sociais, receando não entender as conversas ou pedir constantemente para repetirem o que foi dito. A frustração instala-se, tanto na pessoa afetada como nos familiares e amigos.

A tecnologia moderna trouxe soluções impressionantes. Os aparelhos auditivos atuais são pequenas maravilhas da engenharia, capazes de se conectarem a smartphones, televisões e até sistemas de som domésticos. Muitos são praticamente invisíveis e adaptam-se automaticamente a diferentes ambientes sonoros. No entanto, o estigma persiste. Muitos associam ainda estes dispositivos à velhice ou à deficiência, quando na realidade deveriam ser vistos como acessórios de bem-estar, tal como os óculos.

O caminho para uma melhor saúde auditiva em Portugal passa pela educação e prevenção. A realização de exames auditivos regulares deveria tornar-se tão comum como a ida ao dentista ou ao oftalmologista. Locais de trabalho com níveis sonoros elevados precisam de implementar programas de proteção auditiva. E as famílias devem aprender a reconhecer os sinais precoces de problemas auditivos nos seus entes queridos.

O som do silêncio pode ser poético na música, mas na vida real representa uma barreira que separa as pessoas do mundo que as rodeia. Quebrar este silêncio requer coragem para admitir a necessidade de ajuda e a compreensão de que cuidar da audição é cuidar da qualidade de vida. Afinal, ouvir não é apenas perceber sons - é participar ativamente na sinfonia da vida quotidiana.

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