O preço da energia em Portugal: quando é que vamos parar de pagar a conta mais cara da Europa?

O preço da energia em Portugal: quando é que vamos parar de pagar a conta mais cara da Europa?
Há um segredo sujo que todos conhecemos mas ninguém quer discutir à mesa de jantar: os portugueses estão a pagar pela energia mais cara da Europa Ocidental. Enquanto os nossos vizinhos espanhóis beneficiam de tarifas que fazem corar de inveja qualquer consumidor lusitano, nós continuamos a desembolsar valores que desafiam a lógica económica. A pergunta que fica no ar, como um fantasma a pairar sobre as contas da luz, é simples: porquê?

A resposta, como tudo na vida, não é linear. Começa nos contratos de longo prazo com fornecedores de gás natural, assinados numa época em que a energia era barata e a aposta nas renováveis parecia uma miragem distante. Estes acordos, que nos prendem a preços acima do mercado, são como algemas douradas: brilham com a promessa da segurança energética, mas mantêm-nos presos a um passado que já não existe.

Enquanto isso, os espanhóis aproveitaram-se de uma posição geográfica privilegiada e de investimentos massivos em interligações com o resto da Europa. O seu mercado tornou-se mais líquido, mais competitivo e, consequentemente, mais barato. Nós, do nosso lado da fronteira, ficámos com um sistema mais isolado, mais dependente do gás natural e menos capaz de aproveitar as flutuações positivas do mercado internacional.

Mas o problema não se resume às infraestruturas ou aos contratos antigos. Há todo um ecossistema de taxas e impostos que transforma cada kilowatt-hora numa pequena fortuna para o consumidor final. A fatura da luz tornou-se num verdadeiro labirinto fiscal, onde se perdem até os mais entendidos em matérias energéticas.

O que mais custa a digerir é que Portugal é, paradoxalmente, um dos países europeus com maior potencial em energias renováveis. Temos sol como quase ninguém na Europa, vento em abundância e um litoral que poderia ser a Arábia Saudita da energia das ondas. No entanto, continuamos dependentes de combustíveis fósseis como se estivéssemos nos anos 80.

A transição energética, essa palavra mágica que todos repetem mas poucos compreendem na sua totalidade, tornou-se num cavalo de batalha político. Cada governo que passa promete revolucionar o sector, mas as mudanças são lentas, dolorosas e, muitas vezes, insuficientes. Os cidadãos ficam no meio, a pagar a conta de uma transformação que parece nunca chegar.

As grandes empresas energéticas, essas, navegam nestas águas turbulentas com uma perícia que deixaria invejosos os melhores capitães de navio. Enquanto os consumidores se queixam, elas apresentam lucros recorde ano após ano. A justificação é sempre a mesma: os custos de operação, os investimentos em renováveis, a necessidade de manter a segurança do sistema.

Mas há luz no fim do túnel, mesmo que ainda seja fraca. Os projetos de energia solar estão a multiplicar-se por todo o país, com leilões que atraem investidores internacionais. A eólica offshore começa a ser uma realidade no nosso horizonte marítimo. E as comunidades energéticas, ainda em fase embrionária, prometem devolver o poder aos cidadãos.

O verdadeiro desafio, porém, não é técnico nem financeiro. É cultural. Precisamos de abandonar a mentalidade de que a energia é um bem infinito e barato, e abraçar a eficiência energética como forma de vida. As casas portuguesas continuam entre as menos eficientes da Europa, um legado de décadas de construção sem preocupações ambientais.

Enquanto isso, os mais vulneráveis da sociedade são os que mais sofrem com esta situação. As famílias de baixos rendimentos gastam uma percentagem desproporcionada do seu orçamento em energia, criando uma nova forma de pobreza: a pobreza energética. É um problema silencioso, que não faz manchetes mas destrói vidas.

A solução passa por uma abordagem múltipla: mais investimento em renováveis, renegociação dos contratos desvantajosos, simplificação do sistema fiscal da energia e, acima de tudo, uma verdadeira revolução na eficiência energética dos edifícios. São mudanças estruturais que requerem coragem política e visão de longo prazo.

O que está em jogo não é apenas o preço que pagamos pela luz. É a competitividade da nossa economia, a qualidade de vida dos cidadãos e, em última análise, o futuro ambiental do país. Continuar com o atual modelo não é uma opção – é uma sentença.

Os próximos anos serão decisivos. Ou aproveitamos o potencial que temos e nos tornamos líderes na transição energética, ou continuaremos a ser o aluno que tem todas as capacidades mas falta à aula. A escolha é nossa, mas o relógio não para.

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