O lado obscuro dos créditos rápidos: como as taxas de juro disparam sem que os portugueses percebam

O lado obscuro dos créditos rápidos: como as taxas de juro disparam sem que os portugueses percebam
Num pequeno escritório em Lisboa, Maria, 34 anos, assina contrato após contrato. A urgência de pagar as contas do mês falou mais alto. O que ela não sabia é que estava a entrar numa espiral de dívida que a iria perseguir durante anos. Os créditos rápidos, aqueles que prometem dinheiro em 24 horas sem burocracias, tornaram-se o pesadelo silencioso de milhares de portugueses.

A investigação do Jornal Económico revela que as taxas de juro efectivas (TAE) nestes empréstimos podem chegar aos 1.800% anuais. Sim, leu bem: mil e oitocentos por cento. Enquanto os bancos tradicionais oferecem créditos pessoais com TAEs entre 8% e 12%, estas empresas online operam numa zona cinzenta da legislação portuguesa.

Como funciona o mecanismo? A maioria dos clientes não percebe que está a contrair um empréstimo a curto prazo com juros compostos diários. Um empréstimo de 500 euros pode transformar-se numa dívida de 2.000 euros em apenas três meses. E o pior: muitas destas empresas não verificam a capacidade de pagamento dos clientes, violando as directrizes do Banco de Portugal.

O Observador documentou dezenas de casos de famílias que perderam o controlo das suas finanças depois de um destes empréstimos. João Silva, de Braga, contou-nos como começou com 300 euros para pagar a renda e terminou com 15.000 euros em dívidas acumuladas. "Eles fazem parecer tão simples... é só clicar aqui e ali e o dinheiro aparece. Mas depois aparece também a cobrança agressiva", desabafa.

A economia.sapo.pt descobriu que muitas destas plataformas operam a partir de paraísos fiscais, usando empresas fantasma registadas no Chipre ou nas Ilhas Virgens Britânicas. Esta estratégia permite-lhes contornar parcialmente a supervisão portuguesa e oferecer condições que seriam ilegais se operassem directamente a partir de Portugal.

O jornal de negócios alerta para uma nova tendência: os microcréditos através de aplicações móveis. Estas apps analisam os dados do telemóvel do utilizador - contactos, histórico de chamadas, localização - para definir o risco de crédito. Um algoritmo decide em segundos se concede ou não o empréstimo, sem intervenção humana.

Mas há esperança no horizonte. A Comissão Europeia está a preparar directivas mais rigorosas para o sector, e o Banco de Portugal aumentou a fiscalização. Além disso, surgiram alternativas mais saudáveis, como as cooperativas de crédito e os sistemas de empréstimo entre particulares (P2P) regulados.

O dinheirovivo.pt entrevistou especialistas que recomendam: antes de clicar em "obter crédito rápido", consulte sempre a instituição onde tem conta. Muitos bancos oferecem linhas de crédito pré-aprovadas com condições muito mais vantajosas. E se a situação for realmente urgente, existem instituições de apoio social que podem ajudar sem cobrar juros astronómicos.

A verdade é que a educação financeira continua a ser a melhor protecção. Saber ler as letras pequenas, entender o que significa TAE e perceber as consequências do incumprimento são armas essenciais num mercado cada vez mais complexo.

Enquanto isso, Maria ainda luta para sair da espiral. "Agora percebo que devia ter procurado ajuda antes. Um momento de desespero custou-me anos de trabalho", confessa. A sua história serve de alerta para todos nós: o dinheiro fácil raramente é realmente fácil.

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