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O silêncio que nos mata: como o stress silencioso está a destruir a saúde dos portugueses

Há uma epidemia silenciosa a espalhar-se pelos escritórios, escolas e lares portugueses. Não aparece nas estatísticas oficiais, não tem sintomas óbvios e raramente é diagnosticada. Chama-se stress crónico e está a minar a saúde mental e física de milhares de pessoas, enquanto o sistema de saúde continua focada nas doenças tradicionais.

Os números são alarmantes. Segundo dados recentes, mais de 60% dos portugueses reportam níveis de stress considerados prejudiciais à saúde. Mas o que mais preocupa os especialistas não são os casos de burnout ou esgotamento nervoso - são os milhões de pessoas que funcionam diariamente num estado de tensão constante, sem sequer se aperceberem do perigo.

O cardiologista Miguel Santos, do Hospital de Santa Maria, explica que o problema começa na forma como o nosso corpo reage ao stress moderno. "Antigamente, o stress era uma resposta aguda a situações de perigo real. Hoje transformou-se num estado crónico. O corpo está constantemente em alerta, mesmo quando não há ameaças imediatas. É como ter o alarme de incêndio sempre a tocar."

Esta exposição constante tem consequências devastadoras. Estudos recentes mostram que o stress crónico aumenta em 40% o risco de doenças cardiovasculares, em 30% o risco de diabetes e está diretamente ligado ao desenvolvimento de doenças autoimunes. Mas o mais preocupante é que a maioria das pessoas nem sequer reconhece os sinais.

"As pessoas normalizaram o cansaço constante, as dores de cabeça frequentes, as insónias e a irritabilidade", diz a psicóloga clínica Ana Lopes. "Acham que é normal viver sempre no limite. Quando chegam ao consultório, já desenvolveram problemas sérios de saúde."

O ambiente de trabalho é um dos principais focos deste problema. A cultura do presentismo, a pressão por resultados e a falta de limites entre vida profissional e pessoal criaram um caldo de cultura perfeito para o stress crónico. E a pandemia veio agravar esta situação, com o teletrabalho a apagar completamente as fronteiras entre casa e escritório.

Mas não são apenas os adultos que sofrem. As crianças e adolescentes estão a desenvolver níveis de ansiedade nunca antes vistos. A pressão escolar, o bullying digital e a exposição constante às redes sociais criaram uma geração que cresce num estado de alerta permanente.

A solução, segundo os especialistas, passa por uma mudança radical na forma como encaramos a saúde mental. "Precisamos de deixar de tratar a saúde mental como um luxo e começarmos a vê-la como uma necessidade básica", defende o psiquiatra Rui Costa. "Assim como escovamos os dentes todos os dias, precisamos de incorporar práticas de gestão do stress na nossa rotina diária."

Algumas empresas já começaram a tomar medidas. Programas de mindfulness, horários flexíveis e políticas de desconexão digital estão a mostrar resultados promissores. Mas os especialistas alertam que estas iniciativas não podem ser apenas cosméticas.

"Não adianta oferecer aulas de ioga se depois se exige que as pessoas trabalhem 12 horas por dia", salienta a especialista em recursos humanos Carla Mendes. "Temos de repensar completamente a forma como organizamos o trabalho e como avaliamos o sucesso."

Do lado do sistema de saúde, também há mudanças em curso. Alguns centros de saúde já implementaram programas de rastreio do stress, e há cada vez mais médicos de família sensibilizados para a importância da saúde mental. Mas os recursos continuam insuficientes para a dimensão do problema.

A tecnologia pode ser uma aliada nesta luta. Apps de meditação, plataformas de terapia online e dispositivos wearables que monitorizam os níveis de stress estão a tornar-se cada vez mais populares. Mas os especialistas alertam para o risco de medicalização excessiva.

"Não podemos tratar o stress como uma doença que precisa apenas de uma pílula", adverte o psicólogo João Silva. "Precisamos de abordar as causas profundas: o ritmo de vida, as expectativas sociais, a forma como nos relacionamos."

O que está em jogo vai muito além do bem-estar individual. O stress crónico tem custos económicos enormes, desde o absentismo até à perda de produtividade. E o mais preocupante é que está a criar uma sociedade doente, onde as pessoas funcionam abaixo do seu potencial.

A solução, segundo os especialistas, terá de ser coletiva. Envolve escolas, empresas, sistema de saúde e, acima de tudo, uma mudança cultural. "Temos de aprender a valorizar o descanso, a estabelecer limites e a reconhecer que a saúde mental é tão importante quanto a física", conclui a psicóloga Ana Lopes.

Enquanto isso não acontecer, continuaremos a viver numa sociedade que glorifica o cansaço e normaliza o sofrimento silencioso. E o preço que pagaremos, em saúde e qualidade de vida, será cada vez mais alto.

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