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O silêncio que mata: como a saúde mental masculina continua a ser a epidemia invisível em Portugal

Nos cafés de Lisboa, nos escritórios do Porto, nos campos alentejanos, decorre uma epidemia silenciosa que ninguém quer ver. Homens portugueses continuam a morrer por dentro enquanto mantêm a fachada de força invencível. Os números são eloqüentes: segundo dados da Direção-Geral da Saúde, a taxa de suicídio entre homens é três vezes superior à das mulheres, um fenómeno que atravessa gerações e regiões.

A cultura do "homem que não chora" persiste como uma herança envenenada passada de pai para filho. No consultório do psicólogo Miguel Santos, no Chiado, as histórias repetem-se: executivos de sucesso que chegam à beira do colapso, operários que carregam dores décadas sem nunca as partilhar, jovens que aprendem desde cedo que vulnerabilidade é sinónimo de fraqueza. "Temos homens que preferem morrer a admitir que precisam de ajuda", confessa o especialista, enquanto reorganiza os livros na estante como se procurasse as palavras certas para descrever o indescritível.

O sistema de saúde português, apesar dos avanços, continua a falhar redondamente na abordagem à saúde mental masculina. As unidades de saúde familiar não têm protocolos específicos para detetar depressão ou ansiedade em homens, e quando detetam, muitas vezes minimizam os sintomas. "Ah, isso é cansaço, descanse um pouco", ouvem muitos pacientes antes de receberem um ansiolítico como solução rápida.

Nas redes sociais, a pressão pela imagem do homem bem-sucedido, sempre feliz e produtivo, cria uma distorção perigosa. Influencers de fitness vendem a ideia de que saúde mental se resolve com mais exercício e dieta perfeita, ignorando completamente a complexidade psicológica humana. O resultado? Homens que quando não conseguem atingir esses padrões irreais afundam-se ainda mais no sentimento de inadequação.

O mundo laboral português funciona como amplificador deste problema. Horários extensos, pressão por resultados e a cultura presenteísta deixam pouco espaço para o autocuidado mental. Muitas empresas ainda vêem pedidos de apoio psicológico como sinal de fraqueza profissional, criando um ambiente onde esconder problemas se torna estratégia de sobrevivência careerista.

Nas zonas rurais, a situação adquire contornos ainda mais dramáticos. Homens mais velhos, muitos viúvos, passam dias inteiros sem falar com ninguém, isolados em casas onde o silêncio só é quebrado pela televisão. Os centros de saúde locais, sobrecarregados, raramente têm recursos para programas de acompanhamento preventivo.

A revolução tem de começar pela educação. Meninos educados para expressar emoções, adolescentes que aprendam que pedir ajuda é acto de coragem, não de covardia. Projectos como o "Homem que Sente", desenvolvido na Universidade de Coimbra, mostram que quando se criam espaços seguros para a partilha masculina, os resultados são transformadores.

O caminho a percorrer é longo, mas cada conversa honesta, cada homem que quebra o silêncio, é uma vitória contra uma cultura tóxica que custa vidas todos os anos. A verdadeira força masculina não está em aguentar tudo calado, mas em ter a coragem de dizer "não estou bem" e procurar ajuda. Essa talvez seja a revolução mais urgente e necessária na saúde portuguesa contemporânea.

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