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O paradoxo energético português: renováveis em alta mas contas a subir

Enquanto Portugal bate recordes na produção de energia renovável, os consumidores continuam a abrir as faturas da luz com um misto de perplexidade e desespero. O país produz hoje mais eletricidade verde do que nunca, mas essa abundância não se reflete na carteira dos portugueses. Esta contradição tornou-se o tema energético mais premente dos últimos meses, alimentando debates acalorados em cafés, escritórios e assembleias legislativas.

A semana passada trouxe mais um marco histórico: as renováveis representaram 89% do consumo elétrico nacional durante 149 horas consecutivas. Os parques eólicos e solares trabalharam a todo o vapor, enquanto as barragens acumulavam água para momentos de menor produção. Estes números, que fariam qualquer ministro do ambiente sorrir, escondem uma realidade menos glamorosa.

Os especialistas apontam para um problema de infraestrutura. A rede elétrica nacional, herdeira de um sistema concebido para grandes centrais a carvão e gás, não está preparada para gerir a intermitência das renováveis. Quando o sol se põe e o vento acalma, o país precisa de acionar centrais térmicas ou importar energia de Espanha - opções significativamente mais caras.

Esta dependência momentânea de fontes convencionais cria picos de preço que contaminam todo o mercado. O mecanismo de formação de preços da eletricidade funciona como um leilão onde o produtor mais caro dita o valor final. Basta que durante algumas horas seja necessário acionar uma central a gás para que toda a energia transacionada nesse período fique mais cara.

O consumidor final, claro, paga a fatura. Literalmente. As famílias portuguesas viram as suas despesas energéticas aumentarem 34% nos últimos dois anos, segundo dados da ERSE. Um paradoxo difícil de digerir quando os noticiários mostram imagens de parques eólicos e solares a produzir energia praticamente gratuita.

A solução, defendem os analistas, passa por investir massivamente em sistemas de armazenamento. As baterias em grande escala e o hidrogénio verde surgem como as apostas estratégicas para resolver esta equação. Portugal já tem projetos piloto em curso, mas a escala ainda é insuficiente para fazer a diferença no mercado.

Enquanto isso, os cidadãos adaptam-se como podem. A procura por painéis solares domésticos disparou 180% no último ano, transformando telhados em pequenas centrais elétricas. As comunidades energéticas multiplicam-se pelo país, permitindo que vizinhos produzam e partilhem a sua própria energia.

Esta revolução silenciosa a nível local contrasta com a lentidão das mudanças a nível nacional. A descarbonização da economia avança a dois velocidades: rápida na produção, lenta na distribuição e no armazenamento. O resultado é um sistema elétrico em transição, cheio de potencial mas ainda preso a amarras do passado.

Os próximos meses serão decisivos. O Plano Nacional de Energia e Clima 2030 promete investimentos históricos em redes inteligentes e armazenamento. A Europa disponibiliza fundos de recuperação que Portugal quer canalizar para esta modernização. O desafio será garantir que esta vez a revolução chega também à fatura dos consumidores.

Enquanto aguardamos por estas mudanças estruturais, os portugueses continuam a navegar num mercado energético cada vez mais complexo. A escolha entre comercializadores, a leitura de faturas cheias de siglas incompreensíveis e a gestão do consumo tornaram-se habilidades de sobrevivência urbana.

O paradoxo energético português resume-se assim: produzimos cada vez mais energia barata, mas continuamos a pagá-la cara. A resolução deste enigma dependerá não apenas de tecnologia, mas sobretudo de vontade política e de um novo modelo de mercado que reflita a realidade das renováveis.

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