O paradoxo energético português: como temos sol e vento de sobra mas pagamos a luz como se não os tivéssemos
Num país banhado pelo sol quase todo o ano e com ventos que moldaram a nossa história marítima, há uma ironia que persiste: Portugal continua refém de preços de energia que pouco refletem a nossa abundância natural. Enquanto os discursos políticos enchem a boca com transição energética, os consumidores veem as faturas da luz subir como se vivêssemos num país sem recursos renováveis.
A verdade é que Portugal já foi pioneiro. Recordam-se da barragem do Alqueva? Foi aclamada como a solução para a nossa independência energética. Duas décadas depois, continuamos a importar eletricidade de Espanha nos picos de consumo. O problema não está na falta de infraestruturas, mas sim na forma como as utilizamos - ou melhor, como as subutilizamos.
O setor eólico é outro exemplo desta esquizofrenia energética. Temos parques eólicos que, em dias de vento forte, produzem mais do que conseguimos consumir. E o que acontece? Vendemos o excedente a preços baixíssimos para os nossos vizinhos ibéricos, que depois nos revendem a mesma energia quando precisamos, mas já com uma margem de lucro considerável. É como ter uma horta cheia de legumes e continuar a comprar comida enlatada no supermercado.
A energia solar vive o seu próprio drama shakespeariano. Os painéis solares multiplicam-se pelos telhados do Algarve ao Minho, mas a burocracia para injectar energia na rede continua a ser um labirinto kafkiano. As comunidades energéticas, essa promessa de democratização do sol, esbarram em regulamentos que parecem desenhados para manter o status quo.
E depois há o gás natural, esse fiel companheiro que teima em não nos abandonar. Enquanto a Europa discute o hidrogénio verde, Portugal debate-se com termoelétricas a gás que funcionam como muleta para quando o sol se põe e o vento acalma. A transição justa de que tanto se fala parece mais um slogan de campanha do que uma realidade tangível para as famílias que escolhem entre ligar o aquecedor ou poupar para o jantar.
O mercado ibérico de energia (MIBEL), criado para harmonizar preços, transformou-se num casamento de conveniência onde Portugal sai sistematicamente prejudicado. A nossa localização periférica e a menor dimensão da rede tornam-nos o parceiro mais fraco nesta dança de megawatts. Enquanto isso, as grandes empresas energéticas continuam a reportar lucros recorde, alimentando a perceção de que a descarbonização está a ser paga pelos consumidores e não pelos poluidores.
Mas nem tudo são más notícias. Projetos como a central solar do Cercal, no Alentejo, ou o cluster de hidrogénio verde em Sines mostram que há luz ao fundo do túnel. A questão é saber se essa luz chegará às casas dos portugueses com preços justos ou se será mais um benefício para os acionistas das multinacionais.
A verdadeira revolução energética em Portugal não passará por mais megaprojetos, mas pela capacidade de tornar os cidadãos produtores e não apenas consumidores. Quando uma família puder vender o excesso da sua produção solar ao vizinho do lado, sem intermediários nem comissões absurdas, então sim estaremos no caminho certo.
O paradoxo português resume-se a isto: temos recursos para ser a Arábia Saudita das renováveis, mas continuamos a pensar como um país sem sol nem vento. Até quando?
A verdade é que Portugal já foi pioneiro. Recordam-se da barragem do Alqueva? Foi aclamada como a solução para a nossa independência energética. Duas décadas depois, continuamos a importar eletricidade de Espanha nos picos de consumo. O problema não está na falta de infraestruturas, mas sim na forma como as utilizamos - ou melhor, como as subutilizamos.
O setor eólico é outro exemplo desta esquizofrenia energética. Temos parques eólicos que, em dias de vento forte, produzem mais do que conseguimos consumir. E o que acontece? Vendemos o excedente a preços baixíssimos para os nossos vizinhos ibéricos, que depois nos revendem a mesma energia quando precisamos, mas já com uma margem de lucro considerável. É como ter uma horta cheia de legumes e continuar a comprar comida enlatada no supermercado.
A energia solar vive o seu próprio drama shakespeariano. Os painéis solares multiplicam-se pelos telhados do Algarve ao Minho, mas a burocracia para injectar energia na rede continua a ser um labirinto kafkiano. As comunidades energéticas, essa promessa de democratização do sol, esbarram em regulamentos que parecem desenhados para manter o status quo.
E depois há o gás natural, esse fiel companheiro que teima em não nos abandonar. Enquanto a Europa discute o hidrogénio verde, Portugal debate-se com termoelétricas a gás que funcionam como muleta para quando o sol se põe e o vento acalma. A transição justa de que tanto se fala parece mais um slogan de campanha do que uma realidade tangível para as famílias que escolhem entre ligar o aquecedor ou poupar para o jantar.
O mercado ibérico de energia (MIBEL), criado para harmonizar preços, transformou-se num casamento de conveniência onde Portugal sai sistematicamente prejudicado. A nossa localização periférica e a menor dimensão da rede tornam-nos o parceiro mais fraco nesta dança de megawatts. Enquanto isso, as grandes empresas energéticas continuam a reportar lucros recorde, alimentando a perceção de que a descarbonização está a ser paga pelos consumidores e não pelos poluidores.
Mas nem tudo são más notícias. Projetos como a central solar do Cercal, no Alentejo, ou o cluster de hidrogénio verde em Sines mostram que há luz ao fundo do túnel. A questão é saber se essa luz chegará às casas dos portugueses com preços justos ou se será mais um benefício para os acionistas das multinacionais.
A verdadeira revolução energética em Portugal não passará por mais megaprojetos, mas pela capacidade de tornar os cidadãos produtores e não apenas consumidores. Quando uma família puder vender o excesso da sua produção solar ao vizinho do lado, sem intermediários nem comissões absurdas, então sim estaremos no caminho certo.
O paradoxo português resume-se a isto: temos recursos para ser a Arábia Saudita das renováveis, mas continuamos a pensar como um país sem sol nem vento. Até quando?