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O labirinto energético: como as famílias portuguesas pagam a conta da transição verde

A luz acende-se com um simples interruptor, mas a conta que chega todos os meses esconde um labirinto de custos, subsídios e decisões políticas que poucos compreendem. Enquanto o governo anuncia metas ambiciosas para as energias renováveis, as famílias portuguesas sentem no bolso o peso de uma transição que promete um futuro mais verde, mas que no presente parece desequilibrada.

Nas últimas semanas, os portais de economia e notícias portugueses têm revelado dados preocupantes: o preço da eletricidade para consumidores domésticos subiu 34% desde o início do ano, segundo a ERSE. Este aumento não é um acidente estatístico, mas o resultado de uma complexa teia onde se entrelaçam os custos das renováveis, as compensações às centrais a gás e os investimentos em redes que ainda não conseguem acompanhar a produção solar e eólica.

O Observador destacou recentemente como os custos de acesso às redes representam hoje quase um terço da fatura elétrica. São esses euros que financiam a modernização da infraestrutura nacional, mas também subsidiam ligações de parques eólicos em locais remotos. Enquanto isso, o ECO revelou que os produtores independentes de energia solar recebem tarifas até três vezes superiores ao preço de mercado, custo que é repassado aos consumidores através da fatura.

A ironia é cruel: Portugal produz cada vez mais energia renovável a custo quase zero (o sol e o vento não enviam faturas), mas as famílias pagam cada vez mais. O Dinheiro Vivo mostrou como o mecanismo de ajustamento marginal, que determina o preço final da eletricidade, continua ancorado ao gás natural. Quando uma central a gás precisa ser ligada para cobrir picos de consumo, o seu custo elevado define o preço para toda a energia transacionada, incluindo a renovável que foi produzida quase de graça.

Esta distorção de mercado cria situações absurdas documentadas pelo Expresso: em dias particularmente ventosos, quando as eólicas produzem acima das expectativas, Portugal chega a pagar a Espanha para levar o excedente, porque não tem capacidade de armazenamento suficiente. No dia seguinte, quando o vento acalma, compra energia produzida a gás ao preço máximo. A conta desta dança energética? Chega às famílias portuguesas.

O Jornal de Negócios investigou outro ângulo pouco falado: a concentração do mercado. Três grupos controlam mais de 80% da produção renovável em Portugal, criando um oligopólio que limita a concorrência e mantém preços artificialmente altos. As pequenas cooperativas de energia que surgiram com promessas de preços mais justos enfrentam barreiras burocráticas e custos de ligação às redes que as tornam inviáveis para a maioria dos cidadãos.

A TSF trouxe para a discussão o drama humano por trás dos números: cada vez mais famílias em situação de pobreza energética, que escolhem entre comer aquecido ou ter a casa aquecida. São histórias de reformados que passam o inverno com cobertores em cima do casaco, de mães que preparam o jantar dos filhos ao final da tarde para aproveitar a luz natural e poupar na eletricidade.

A transição energética é necessária e urgente, ninguém duvida. Mas a forma como está a ser implementada em Portugal cria injustiças flagrantes. Enquanto grandes empresas recebem subsídios milionários para instalar painéis solares, o cidadão comum enfrenta uma burocracia kafkiana para colocar os seus próprios painéis no telhado. Enquanto se investem milhões em hidrogénio verde, projetos que só darão retorno daqui a uma década, não há fundos para isolar as casas de quem hoje passa frio.

O caminho para a neutralidade carbónica não pode ser pavimentado com a pobreza energética das famílias. Precisa de transparência nos custos, de regulação que proteja os consumidores mais vulneráveis, de investimento real em armazenamento e redes inteligentes. Precisa, acima de tudo, de colocar as pessoas no centro da equação energética.

A próxima vez que acender a luz, lembre-se: por trás desse gesto simples está um sistema complexo que precisa de reforma urgente. A energia do futuro tem de ser limpa, mas também justa e acessível. Caso contrário, estaremos a construir um mundo verde apenas para quem o pode pagar.

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