Seguros

Energia

Serviços domésticos

Telecomunicações

Saúde

Segurança Doméstica

Energia Solar

Seguro Automóvel

Aparelhos Auditivos

Créditos

Educação

Paixão por carros

Seguro de Animais de Estimação

Blogue

O jogo sujo da energia: como as grandes empresas manipulam o mercado e os consumidores pagam a fatura

Nas sombras dos gabinetes com vista para o Tejo e do Porto de Leixões, um jogo de poder está a redefinir o que pagamos pela luz que acende as nossas casas. Não é uma conspiração de filmes de espionagem, mas uma realidade documentada em relatórios que poucos leem e em reuniões a que ainda menos têm acesso. Enquanto os discursos públicos falam de transição energética e sustentabilidade, os números contam outra história: uma de margens de lucro que desafiam a lógica e de estratégias que deixam os portugueses reféns de contas que não param de subir.

A primeira peça deste puzzle está na forma como o preço da eletricidade é definido. O mercado ibérico de energia (MIBEL) funciona com um mecanismo que privilegia a fonte mais cara. Quando o gás natural, historicamente caro, define o preço final, todas as outras fontes – incluindo a solar e eólica, muito mais baratas – são remuneradas ao mesmo valor elevado. O resultado? Empresas que produzem energia renovável com custos baixíssimos embolsam lucros extraordinários, enquanto os consumidores são espremidos por uma fatura que não reflete o custo real da produção.

Mas o problema não para aqui. Investigámos contratos de fornecimento de gás natural e descobrimos cláusulas que parecem saídas de um manual de má prática comercial. Indexações a índices obscuros, renovações automáticas sem aviso prévio, e penalizações por mudança de fornecedor que chegam a valer mais do que a poupança anual. Muitas famílias e pequenas empresas estão presas a estas condições, assinadas em letra pequena que ninguém lê até ser tarde demais.

Enquanto isso, os grandes grupos energéticos apresentam resultados financeiros que fariam corar qualquer setor. No primeiro semestre deste ano, as principais empresas do sector em Portugal aumentaram os seus lucros em percentagens de dois dígitos, num período em que a inflação energética era o fantasma que assombrava a economia. Estes números não são fruto do acaso, mas de uma estratégia concertada de maximização de receitas em todos os elos da cadeia – da produção ao comercial.

A transição energética, esse grande desígnio nacional, tornou-se também um campo fértil para manobras duvidosas. Projetos de centrais solares e parques eólicos são anunciados com pompa e circunstância, mas os prazos de construção alongam-se misteriosamente. Esta demora artificial mantém a oferta de energia mais barata abaixo do necessário, perpetuando a dependência de fontes mais caras. É um jogo de espera em que, mais uma vez, quem perde é o consumidor final.

Nos bastidores, o lobby energético trabalha horas extras. Relatórios de transparência mostram que as principais empresas do setor têm dezenas de reuniões anuais com decisores políticos, enquanto associações de consumidores contam os encontros nos dedos de uma mão. Esta assimetria de influência molda legislação e regulamentação, criando um ambiente que protege mais os interesses corporativos do que os cidadãos.

A solução não passa por teorias da conspiração, mas por transparência radical. Precisamos de saber exatamente como se forma o preço que pagamos, que contratos estão a ser assinados em nosso nome, e que lucros estão a ser gerados em cada etapa do processo. A digitalização e abertura de dados podem ser aliadas poderosas nesta batalha, mas apenas se forem usadas para iluminar o que hoje está nas sombras.

O momento de viragem pode estar mais perto do que pensamos. Novos players no mercado, cooperativas de energia cidadã, e tecnologias de autoconsumo estão a desafiar o status quo. Mas para que esta mudança seja real, é preciso desmontar as estruturas que perpetuam um sistema disfuncional. A energia não pode ser um casino onde apenas a banca ganha sempre. Tem de voltar a ser um serviço essencial, acessível e justo para todos os que dependem dele no seu dia a dia.

Tags