O labirinto dos créditos ao consumo: como os portugueses estão a financiar o presente à custa do futuro
Num país onde o ordenado mínimo mal chega para cobrir as despesas básicas, os portugueses estão a recorrer cada vez mais ao crédito ao consumo como uma tábua de salvação financeira. Os números não mentem: segundo dados do Banco de Portugal, o volume de crédito pessoal aumentou 7,3% no último ano, um sinal preocupante de que as famílias estão a usar o cartão de crédito e os empréstimos pessoais para tapar buracos no orçamento mensal.
O fenómeno não é novo, mas a sua dimensão atual revela uma mudança estrutural na forma como os portugueses encaram o endividamento. Se antes o crédito era visto como um recurso para aquisições pontuais - um carro, uma viagem especial - hoje transformou-se numa ferramenta de sobrevivência do dia-a-dia. Supermercados, farmácias e até postos de combustível tornaram-se locais onde o cartão de crédito substitui progressivamente o dinheiro vivo.
Esta normalização do endividamento preocupa os especialistas. "Estamos a criar uma geração que não distingue entre o que pode pagar e o que deseja ter", alerta Maria João Silva, economista especializada em finanças pessoais. "O problema não é o crédito em si, mas o uso que dele fazemos quando se torna a única forma de manter um padrão de vida que o rendimento não suporta."
A banca comercial, por seu lado, adaptou-se a esta nova realidade. Os spreads baixaram para níveis historicamente reduzidos, as campanhas publicitárias multiplicam-se e o processo de aprovação tornou-se mais ágil do que nunca. Basta um clique no smartphone para ter acesso a milhares de euros, sem a burocracia que caracterizava o sistema financeiro há uma década.
Mas esta facilidade tem um preço escondido. As taxas anuais efetivas globais (TAEG) podem chegar aos 12% em alguns produtos, um valor que, quando somado ao capital emprestado, representa um custo significativo para orçamentos já debilitados. E é aqui que mora o perigo: muitos consumidores focam-se na prestação mensal, ignorando o montante total que acabarão por pagar ao longo do tempo.
A situação agrava-se quando analisamos o perfil dos novos endividados. Cada vez mais jovens, com empregos precários e rendimentos instáveis, estão a contrair créditos que podem comprometer a sua estabilidade financeira durante anos. "Vejo casos de pessoas com 25 anos que já acumularam dívidas equivalentes a dois anos de salário", conta um gestor de conta de um banco português que preferiu manter o anonimato.
O crédito ao consumo tornou-se também uma ferramenta política. Nos últimos anos, assistimos a um debate intenso sobre a regulação do sector, com propostas que vão desde a limitação das taxas de juro à criação de mecanismos de proteção mais robustos para os consumidores. A linha que separa a liberdade de escolha individual da necessidade de proteção contra práticas predatórias é ténue e controversa.
Enquanto isso, as fintechs entraram no jogo com propostas disruptivas. Plataformas de empréstimo entre particulares, sistemas de crédito baseados em análise comportamental e aplicações que prometem aprovação instantânea estão a desafiar o modelo tradicional dos bancos. Esta concorrência trouxe inovação, mas também novos riscos que os reguladores ainda estão a aprender a gerir.
O que parece claro é que o crédito ao consumo veio para ficar como elemento central da economia portuguesa. A questão não é se devemos usá-lo, mas como podemos fazê-lo de forma responsável. Educação financeira desde a escola, transparência total nos contratos e uma avaliação realista da capacidade de pagamento são ingredientes essenciais para evitar que o remédio se transforme em veneno.
Num mundo de incertezas económicas, o crédito pode ser uma âncora ou um peso - a diferença está na forma como o utilizamos. Os portugueses estão a aprender esta lição da maneira mais difícil, enquanto navegam pelas águas turbulentas de uma economia que promete muito mas exige ainda mais.
O fenómeno não é novo, mas a sua dimensão atual revela uma mudança estrutural na forma como os portugueses encaram o endividamento. Se antes o crédito era visto como um recurso para aquisições pontuais - um carro, uma viagem especial - hoje transformou-se numa ferramenta de sobrevivência do dia-a-dia. Supermercados, farmácias e até postos de combustível tornaram-se locais onde o cartão de crédito substitui progressivamente o dinheiro vivo.
Esta normalização do endividamento preocupa os especialistas. "Estamos a criar uma geração que não distingue entre o que pode pagar e o que deseja ter", alerta Maria João Silva, economista especializada em finanças pessoais. "O problema não é o crédito em si, mas o uso que dele fazemos quando se torna a única forma de manter um padrão de vida que o rendimento não suporta."
A banca comercial, por seu lado, adaptou-se a esta nova realidade. Os spreads baixaram para níveis historicamente reduzidos, as campanhas publicitárias multiplicam-se e o processo de aprovação tornou-se mais ágil do que nunca. Basta um clique no smartphone para ter acesso a milhares de euros, sem a burocracia que caracterizava o sistema financeiro há uma década.
Mas esta facilidade tem um preço escondido. As taxas anuais efetivas globais (TAEG) podem chegar aos 12% em alguns produtos, um valor que, quando somado ao capital emprestado, representa um custo significativo para orçamentos já debilitados. E é aqui que mora o perigo: muitos consumidores focam-se na prestação mensal, ignorando o montante total que acabarão por pagar ao longo do tempo.
A situação agrava-se quando analisamos o perfil dos novos endividados. Cada vez mais jovens, com empregos precários e rendimentos instáveis, estão a contrair créditos que podem comprometer a sua estabilidade financeira durante anos. "Vejo casos de pessoas com 25 anos que já acumularam dívidas equivalentes a dois anos de salário", conta um gestor de conta de um banco português que preferiu manter o anonimato.
O crédito ao consumo tornou-se também uma ferramenta política. Nos últimos anos, assistimos a um debate intenso sobre a regulação do sector, com propostas que vão desde a limitação das taxas de juro à criação de mecanismos de proteção mais robustos para os consumidores. A linha que separa a liberdade de escolha individual da necessidade de proteção contra práticas predatórias é ténue e controversa.
Enquanto isso, as fintechs entraram no jogo com propostas disruptivas. Plataformas de empréstimo entre particulares, sistemas de crédito baseados em análise comportamental e aplicações que prometem aprovação instantânea estão a desafiar o modelo tradicional dos bancos. Esta concorrência trouxe inovação, mas também novos riscos que os reguladores ainda estão a aprender a gerir.
O que parece claro é que o crédito ao consumo veio para ficar como elemento central da economia portuguesa. A questão não é se devemos usá-lo, mas como podemos fazê-lo de forma responsável. Educação financeira desde a escola, transparência total nos contratos e uma avaliação realista da capacidade de pagamento são ingredientes essenciais para evitar que o remédio se transforme em veneno.
Num mundo de incertezas económicas, o crédito pode ser uma âncora ou um peso - a diferença está na forma como o utilizamos. Os portugueses estão a aprender esta lição da maneira mais difícil, enquanto navegam pelas águas turbulentas de uma economia que promete muito mas exige ainda mais.