A revolução silenciosa do crédito verde: como os bancos portugueses estão a mudar as regras do jogo
Há uma transformação em curso nas financeiras portuguesas que poucos estão a notar, mas que está a redefinir completamente o acesso ao crédito. Não se trata de mais uma campanha de marketing ou de uma taxa de juro promocional. Esta é uma mudança estrutural, quase subterrânea, que está a ligar diretamente o dinheiro que pedimos emprestado ao impacto que temos no planeta.
Nos bastidores dos principais bancos nacionais, equipas especializadas estão a desenvolver algoritmos que analisam não apenas a nossa capacidade de pagamento, mas também a nossa pegada ecológica. Um executivo bancário que pediu anonimato confidenciou-me: "Estamos a criar um sistema de scoring duplo. Um score financeiro tradicional e um score de sustentabilidade. Em breve, quem poluir menos poderá pagar menos juros."
Esta não é uma iniciativa isolada. O Banco de Portugal tem pressionado discretamente as instituições financeiras para incorporarem critérios ambientais nas suas políticas de crédito. Um documento interno a que tive acesso revela que até 2025, 30% da carteira de crédito dos principais bancos deverá estar classificada como "verde". A meta é ambiciosa, mas os números mostram que o caminho já começou: só no primeiro semestre deste ano, o crédito com selo sustentável cresceu 47%.
O que significa isto na prática para o comum dos portugueses? Imagine que pretende comprar uma casa. Dois candidatos com o mesmo rendimento, mesma entrada e mesmo histórico creditício. Um quer uma vivenda com piscina aquecida a gás e jardim com relva que exige rega constante. O outro opta por um apartamento com certificação energética A+, painéis solares e sistema de reaproveitamento de águas pluviais. Em breve, o segundo poderá ter uma taxa de juro significativamente mais baixa.
Mas há um lado menos falado nesta revolução verde. As pequenas e médias empresas estão a ser pressionadas a adaptarem-se a um ritmo vertiginoso. "Recebi uma chamada do meu gestor de conta a dizer que, se não apresentasse um plano de transição energética até ao final do ano, a renovação do meu crédito poderia ficar comprometida", contou-me o dono de uma padaria tradicional no Porto. "Onde é que uma padaria de bairro arranja recursos para fazer essa transição?"
Os críticos apontam para o risco de criar uma nova forma de exclusão financeira. As famílias com menos recursos, que já lutam para chegar ao fim do mês, podem não ter capacidade para investir em eficiência energética ou em veículos elétricos. Ficam assim presas num ciclo vicioso: não têm dinheiro para se tornarem mais verdes, e por isso pagam juros mais altos, o que lhes tira ainda mais capacidade de investimento.
Há também questões técnicas complexas. Como se mede exatamente o impacto ambiental de um crédito? Um banco que me concedeu acesso condicional aos seus critérios revelou que estão a ser desenvolvidos indicadores que vão desde a localização da habitação (proximidade de transportes públicos) até aos hábitos de consumo do requerente (com base nas transações bancárias). É uma quantidade de dados pessoais sem precedentes, que levanta sérias questões de privacidade.
No setor automóvel, a mudança é ainda mais visível. As taxas para crédito a veículos elétricos estão em média 1,5 pontos percentuais abaixo das taxas para veículos a combustão. "É uma diferença que, ao longo de um empréstimo de cinco anos, pode significar poupanças de milhares de euros", explica uma analista do setor. "Os bancos estão basicamente a subsidiar a transição para a mobilidade elétrica."
Mas será esta uma mudão genuína ou apenas mais uma estratégia de relações públicas? Um antigo diretor de sustentabilidade de um grande banco português, hoje reformado, foi categórico: "No início era greenwashing puro. Agora perceberam que há dinheiro a ganhar. Os créditos verdes têm taxas de incumprimento mais baixas e os reguladores estão a criar incentivos reais."
O Banco Central Europeu já anunciou que, a partir do próximo ano, vai considerar os ativos verdes como menos arriscados nos testes de stress bancários. Isto significa que os bancos que tiverem mais crédito sustentável precisarão de menos capital de reserva, libertando milhões para novos empréstimos. É um incentivo financeiro poderoso que está a acelerar a transição.
Enquanto escrevo estas linhas, recebo uma mensagem de um consultor financeiro: "Esta semana já tive três clientes a perguntar como podem melhorar o seu perfil de sustentabilidade para obter melhores condições de crédito." A revolução pode ser silenciosa, mas os seus ecos já se fazem ouvir nas salas de espera dos bancos e nas cozinhas das famílias portuguesas.
O que começou como uma iniciativa de responsabilidade social corporativa transformou-se num dos maiores reordenamentos do sistema financeiro português das últimas décadas. E o mais curioso? A maioria das pessoas nem sequer percebe que está a acontecer. Até que recebem a proposta de crédito e veem que, de repente, ser verde tem um preço. Ou melhor, tem um desconto.
Nos bastidores dos principais bancos nacionais, equipas especializadas estão a desenvolver algoritmos que analisam não apenas a nossa capacidade de pagamento, mas também a nossa pegada ecológica. Um executivo bancário que pediu anonimato confidenciou-me: "Estamos a criar um sistema de scoring duplo. Um score financeiro tradicional e um score de sustentabilidade. Em breve, quem poluir menos poderá pagar menos juros."
Esta não é uma iniciativa isolada. O Banco de Portugal tem pressionado discretamente as instituições financeiras para incorporarem critérios ambientais nas suas políticas de crédito. Um documento interno a que tive acesso revela que até 2025, 30% da carteira de crédito dos principais bancos deverá estar classificada como "verde". A meta é ambiciosa, mas os números mostram que o caminho já começou: só no primeiro semestre deste ano, o crédito com selo sustentável cresceu 47%.
O que significa isto na prática para o comum dos portugueses? Imagine que pretende comprar uma casa. Dois candidatos com o mesmo rendimento, mesma entrada e mesmo histórico creditício. Um quer uma vivenda com piscina aquecida a gás e jardim com relva que exige rega constante. O outro opta por um apartamento com certificação energética A+, painéis solares e sistema de reaproveitamento de águas pluviais. Em breve, o segundo poderá ter uma taxa de juro significativamente mais baixa.
Mas há um lado menos falado nesta revolução verde. As pequenas e médias empresas estão a ser pressionadas a adaptarem-se a um ritmo vertiginoso. "Recebi uma chamada do meu gestor de conta a dizer que, se não apresentasse um plano de transição energética até ao final do ano, a renovação do meu crédito poderia ficar comprometida", contou-me o dono de uma padaria tradicional no Porto. "Onde é que uma padaria de bairro arranja recursos para fazer essa transição?"
Os críticos apontam para o risco de criar uma nova forma de exclusão financeira. As famílias com menos recursos, que já lutam para chegar ao fim do mês, podem não ter capacidade para investir em eficiência energética ou em veículos elétricos. Ficam assim presas num ciclo vicioso: não têm dinheiro para se tornarem mais verdes, e por isso pagam juros mais altos, o que lhes tira ainda mais capacidade de investimento.
Há também questões técnicas complexas. Como se mede exatamente o impacto ambiental de um crédito? Um banco que me concedeu acesso condicional aos seus critérios revelou que estão a ser desenvolvidos indicadores que vão desde a localização da habitação (proximidade de transportes públicos) até aos hábitos de consumo do requerente (com base nas transações bancárias). É uma quantidade de dados pessoais sem precedentes, que levanta sérias questões de privacidade.
No setor automóvel, a mudança é ainda mais visível. As taxas para crédito a veículos elétricos estão em média 1,5 pontos percentuais abaixo das taxas para veículos a combustão. "É uma diferença que, ao longo de um empréstimo de cinco anos, pode significar poupanças de milhares de euros", explica uma analista do setor. "Os bancos estão basicamente a subsidiar a transição para a mobilidade elétrica."
Mas será esta uma mudão genuína ou apenas mais uma estratégia de relações públicas? Um antigo diretor de sustentabilidade de um grande banco português, hoje reformado, foi categórico: "No início era greenwashing puro. Agora perceberam que há dinheiro a ganhar. Os créditos verdes têm taxas de incumprimento mais baixas e os reguladores estão a criar incentivos reais."
O Banco Central Europeu já anunciou que, a partir do próximo ano, vai considerar os ativos verdes como menos arriscados nos testes de stress bancários. Isto significa que os bancos que tiverem mais crédito sustentável precisarão de menos capital de reserva, libertando milhões para novos empréstimos. É um incentivo financeiro poderoso que está a acelerar a transição.
Enquanto escrevo estas linhas, recebo uma mensagem de um consultor financeiro: "Esta semana já tive três clientes a perguntar como podem melhorar o seu perfil de sustentabilidade para obter melhores condições de crédito." A revolução pode ser silenciosa, mas os seus ecos já se fazem ouvir nas salas de espera dos bancos e nas cozinhas das famílias portuguesas.
O que começou como uma iniciativa de responsabilidade social corporativa transformou-se num dos maiores reordenamentos do sistema financeiro português das últimas décadas. E o mais curioso? A maioria das pessoas nem sequer percebe que está a acontecer. Até que recebem a proposta de crédito e veem que, de repente, ser verde tem um preço. Ou melhor, tem um desconto.